Não faz tanto tempo assim que jogar a Copa do Brasil era um privilégio reservado aos times ruins demais para conseguir ficar entre os três primeiros do Brasileiro. Nessa época em que o Flamengo era frequentador assíduo da popular competição de pobre era bem bacana quando o Flamengo encontrava seus torcedores mais longínquos para espalhar o evangelho rubro-negro por todas as plagas e rincões do país.
A torcida, sempre senhora das narrativas, usava uma desculpa das mais cretinas para justificar o Flamengo estar jogando a então xumbrega Copa do Brasil: — é o caminho mais curto para a vaga na Libertadores. Como se aqueles Flamengos que foram jogar a Copa do Brasil como prêmio pela própria incompetência tivessem alguma chance na Libertadores. Como se a Copa do Brasil por si só não acrescentasse ao seu vencedor nem um grama de glória esportiva. Era ingratidão e vaidade numa caixa d’água só.
Siga Diário do Fla no Instagram
Mas agora é diferente, hoje a Copa do Brasil oferece uma forte justificativa moral para que os times guerreiem por ela e pelos valores mais belos do esporte: – uma premiação de 56 milhões de reais. Além disso hoje joga todo mundo, a competição ficou muito mais cascuda. Um caso raríssimo no Brasil de algo que melhorou com o tempo, cresceu, ficou mais rico e, isso é incrível, mais justo.
Pra levantar a sua primeira Copa, em 1990, o Flamengo encarou Capelense, Taguatinga, Bahia, Náutico e Goiás. No caminho do bicampeonato em 2006 estavam o ASA de Arapiraca, o ABC, o Guarani, o Atlético e o Ipatinga de Minas e a Vasca na final. Em 2013, aquele Flamengo preparado psicologicamente para não ganhar nada passou por cima do Remo, da Campinense, do ASA, do Cruzeiro, do Botafogo, do Goiás e do Atlético do Paraná.
Aos olhos rubro-negros atuais, mais insaciáveis do que nunca, podem parecer adversários fáceis, mas o Flamengo precisou ser muito Flamengo pra ganhar daqueles caras. A sua vantagem sobre os adversários na maioria das vezes residia exclusivamente nas forças místicas e nos valores imateriais das nossas marcas e símbolos. Dentro de campo foram jogos muito duros, do lado de fora era fé no Manto, DJ! Agora que o Flamengo é um timaço é fácil olhar pras velhas fotos e sorrir amarelo dos nossos perebas, mas todos os caras que levantaram nossas três Copas do Brasil foram heroicos.
Ainda assim, o Flamengo tem um grave problema estatístico com a Copa do Brasil. Levantamos três Copas, mas temos quatro deploráveis vices na competição, sendo um desses vices até mesmo insultuoso. Uma mancha no currículo que só vai ser apagada quando o Flamengo ganhar pelo menos duas Copas do Brasil. Que ainda assim não seriam suficientes para que o Flamengo assumisse a hegemonia da competição. Pra isso faltam quatro. Quem não enxerga a gravidade dessa situação precisa rever seus valores.
Ainda mais agora que a Copa do Brasil, com essa premiação nababesca, é um tema pertinente tanto ao Departamento de Futebol quando ao Departamento Financeiro do clube. Tenho fé que na cultura corporativa que estão implantando no Flamengo desde 2013 perder finais de Copas do Brasil seja terminantemente proibido. Caso ainda não seja até chegar à final ainda temos oito jogos, dá pra organizar.
No primeiro jogo contra o Coritiba já vai dar pra ter uma ideia do nível de vontade da nossa galera. O Flamengo vai sem Gerson, a terceira peça do time canônico de Jesus que dá linha, e sabe-se lá quais dos prisioneiros da CBF serão resgatados em condições de jogo.
Temos reposição pra todo mundo, não com a mesma qualidade, mas jogador não falta. Pode dar uma complicada? Sempre pode, ainda mais no território da antiga Quinta Comarca, onde o Flamengo já levou mais pernadas que o recomendável. Há motivos para escusável medo, surpresa ou violenta emoção com esse jogo micho.
Contudo, malgrado a agressão à humildade que caracteriza o rubro-negro e em flagrante não conformidade com o sapatinho tantas vezes triunfante, há que se ponderar que esse Flamengo x Coritiba poderia ser até no inferno. Com o elenco que o Flamengo tem, ganhar essa Copa do Brasil com umas três rodadas de antecedência é obrigação.