Nesta segunda-feira, o atacante Vinicius Júnior, do Real Madrid e da Seleção Brasileira, foi o escolhido para dar coletiva, tendo em vista o amistoso do Brasil contra a Espanha. Entre diversos assuntos, Vini se emocionou ao comentar sobre a luta contra o racismo.
”É cada vez mais triste. Cada vez eu tenho menos vontade de jogar. Acredito que seja muito triste tudo que eu venho passando a cada jogo, a cada dia, a cada denúncia vai aumentando. É muito triste, mas não só eu, mas todos os negros que sofrem no dia a dia o racismo verbal é minoria perto de tudo que os negros passam no mundo”, disse, antes de emendar:
”Meu pai sempre teve dificuldade por ser negro. Entre ele e um branco, sempre vão escolher um branco. Tenho lutado bastante por tudo que tem acontecido comigo. É desgastante por estar meio sozinho. Já fiz tantas denúncias e ninguém é punido, nenhum clube é punido. A cada dia que passa, luto por todos que passam por isso. Se fosse só por mim e pela família, não sei se continuaria. Mas fui escolhido para defender uma causa bem importante e que eu estudo a cada dia para que no futuro próximo meu irmão de cinco anos não passe pelo que estou passando”, complementou.
Veja outros trechos da entrevista:
Luta contra o racismo
”Quero agradecer desde já a todos os jogadores da Espanha que sempre que dão entrevista estão me apoiando, fazendo de tudo para que a Espanha mude seu pensamento. Não só a Espanha, em todo lugar tem muito racismo. Espero que a gente possa fazer de tudo para diminuir cada vez mais o racismo. Os jogadores da Espanha estão me ajudando muito, falado em entrevistas coisas que no início só eu falava, hoje eles estão junto a mim. Sempre peço que Fifa, Conmebol, Uefa possam fazer mais coisas, como a CBF está fazendo, vem me ajudando para que possamos evoluir como ser humano, para que todos possam estudar para ver o que os pretos passam e passaram. O que eu passo não é nem perto do que todas essas pessoas passaram. Eu quero lutar por aqueles que são preto…”
Ataques na Espanha
”Acredito que eles têm que falar menos de tudo o que eu faço de errado dentro de campo, é claro que tenho que evoluir, mas tenho apenas 23 anos, é um processo natural, saí muito novo do Brasil, não pude aprender tantas coisas. Tenho 23 anos e sigo estudando. Por que os repórteres da Espanha, que são mais velhos do que eu não podem estudar e ver o que realmente está acontecendo, cada vez estou mais triste, cada vez tenho menos vontade de jogar, mas vou seguir lutando”
De onde tira forças
”Acredito que por todas as pessoas que torcem por mim, me acompanham e me mandam cada vez mais mensagens, vou seguir lutando por eles, hoje tenho uma força grande dentro de mim, da minha casa, da minha família, eles me apoiam em tudo o que vou fazer. Nem todos têm esse apoio, podem vir aqui falar por tantas pessoas. Eu quero seguir por eles, por todas pessoas que sabem o que passo e passei e que sabem que é muito difícil”
O que é mais frustrante?
”A falta das punições. Se a gente começar a punir todas essas pessoas que cometem crime e aqui eles não consideram crime, vamos começar a evoluir, tudo vai ficar melhor para todo mundo. Faço tantas denúncias, muitas vezes chegam cartas para fazerem mais denúncias, mas no final acontece como aconteceu com meu amigo em Barcelona, eles arquivam o processo e ninguém sabe de nada. Se a gente começar a punir essas pessoas, não que eles vão mudar o pensamento, mas vão ficar com medo de falar, seja no estádio, onde tem câmeras… e assim vamos diminuir isso, colocar medo naquelas pessoas. E que eles possam também educar seus filhos. Muitas vezes aqui tem criança me xingando e eu não culpo a criança, porque eles não entendem, eu na idade deles não entendia o racismo. É complicado. No futebol tem muitas pessoas, tantos jogadores melhores do que eu que já passaram por aqui, eu quero fazer com que as pessoas no mundo possam evoluir, melhorar, que possamos ter igualdade, que num futuro próximo haja menos casos de racismo, que as pessoas negras possam ter uma vida normal, como as outras. Quero seguir lutando por isso. Se fosse por mim, eu já teria desistido, fico em casa, ninguém vai me xingar, fazer nada comigo… Eu vou para os jogos com a cabeça centrada no jogo para fazer o melhor para minha equipe, mas nem sempre é possível. Tenho que me concentrar muito todos os dias… (Vini chora)”
Jogar no Bernabéu contra a Espanha
”Vai ser um sonho realizado para mim, poder jogar na minha casa aqui na Espanha, o Bernabéu, com a camisa da seleção brasileira, onde sempre sonhei estar. E pela primeira vez com a torcida contra. Vai ser um duelo muito importante para as duas seleções, algumas das maiores do mundo, faz tempo que não se enfrentam. A gente gosta de jogar contra os melhores, como foi contra a Inglaterra, conseguimos fazer um grande jogo. Hoje tem a preparação para o jogo de amanhã contra alguns companheiros meus, estou muito feliz e ansioso para esse duelo, espero que o Brasil possa sair vencedor”
Dica para Endrick
”Muito feliz de ver o Endrick fazendo o seu primeiro gol na seleção e eu acompanhando de perto. Encontrei ele com 15 anos e ele tinha os mesmos sonhos que tem agora, de ser muito feliz, fazer grandes coisas no futebol, e ele vem evoluindo a cada dia, amadurecendo, fazendo tantas coisas com apenas 17 anos. Isso é importante para ele, para a família, espero que ele possa seguir no caminho certo, escutar as pessoas mais experientes que ele, como eu tive o meu processo aqui no Real Madrid, escutar essas pessoas e amadurecer tão rápido. Por chegar aqui com 18 anos, é importante ter essa tranquilidade, é o maior clube do mundo, tem muita pressão, muitas pessoas falando bem e mal de ti. Espero que ele possa fazer tudo de melhor, se ele estiver bem eu vou estar bem, se eu estiver bem, meus companheiros estarão bem, e se meus companheiros estiverem bem o clube vai estar bem. Espero que ele possa ter tranquilidade, vou estar aqui para ajudá-lo em tudo”
Apoio da CBF
”Obrigado. A CBF, o presidente, todo o pessoal que trabalha com ele, todos os atletas sempre me deram a maior força do mundo para a gente seguir lutando junto, não só em campo, mas também fora. O presidente conseguiu mudar as regras, as leis do Brasil, e a cada vez que tem um ato de crime no futebol ele consegue punir essas pessoas. Isso vem diminuindo no Brasil, espero que outras federações do mundo todo possam aprender com o presidente para que possamos nós, jogadores, seguir com a cabeça só no futebol, pois temos jogos a cada dois ou três dias, tenho que me concentrar, me recuperar, também aproveitar com minha família. Espero que eles possam fazer mudanças radicais para que todos os jogadores possam atuar com tranquilidade”
Se sentir escutado
”Hoje entendo mais sobre o racismo, por isso falo com mais propriedade, venho estudando, vendo o que as pessoas passaram. Mohamed Ali ficou sem lutar por essa causa, para lutar pelos seus, eu estou aqui para falar pelo Brasil, com os brasileiros me sinto mais acolhido, mais tudo, é meu país, onde as pessoas realmente me defendem e posso falar com tranquilidade, pois falo português e posso me expressar melhor. Perguntas são sobre coisas que já aconteceram, não me atacando ou não me dando o direito de resposta”, finalizou Vini Jr.