Arthur Muhlenberg: ‘A Maior do Mundo Voltou’

Flamengo segue em frente, exibindo números absurdos, tais como os abusivos 50 gols marcados em tão somente 16 jogos

Foto: Paula Reis/Divulgação Flamengo

Esportivamente o Flamengo x Grêmio pelas quartas da Copa do Brasil valia menos que uma jujuba usada. Refestelado nos escandalosos quatro badejos deixados nas redes gremistas no jogo de ida, o Flamengo entrou em campo leve. Muito mais preocupado em reforçar a união do grupo, botar os recuperandos pra pegar ritmo, prestigiar os moleques e evitar os excessos, do que em dar aquele habitual show do 4×0 Renightiano.

A importância do jogo mesmo, a sua única razão de existir, estava fora das quatro linhas, no ansiado retorno da torcida do Flamengo ao Maracanã, sua casa oficial. Depois de 500 dias de separação consensual, mas ainda assim dolorosa e incompreendida, a Magnética pode, enfim, ocupar seu lugar de fala no terreiro do Maracanã.

E o reencontro da Maior do Mundo com o ex Maior do Mundo foi bonito, principalmente pela sua circunspecção. Em comparação com as assistências multitudinárias que construíram o bom nome da torcida rubro-negra nos últimos 125 anos o rendez-vous foi reservado, praticamente um jogo privé. Só apareceram umas seis mil pessoas, que é menos de 10% da capacidade do estádio. Essa mixaria de povo se explica pelo preço exorbitante do ingresso, as exigências sanitárias do evento-teste e o fato irrecorrível do jogo não valer absolutamente porra nenhuma.

Ainda que representada por uma ínfima fração de bem vestidos a torcida do Flamengo estava linda. Nos takes da arquibancada pela TV era difícil ver alguém sem máscara ou se muvucando além do recomendado em pandemias. Mas é claro que sempre tem uns palhaços querendo aparecer e os stewards tiveram que botar pra fora um ou outro antivac incapaz de seguir regras simples de comportamento. O que é ruim pra avaliação da eficácia do protocolo determinado pela Secretaria de Saúde para que o Maraca possa voltar a receber o galerão de forma definitiva.

Mas fora esses desvios comportamentais, que são próprios desses brasileirinhos cornos e ágrafos que abriram mão voluntariamente da leitura de jornais, livros e de qualquer outra coisa que não seja o Whatsapp ou Telegram, a atuação da torcida foi brilhante. A sua mera presença na parada já extinguiu completamente aquela atmosfera sonora de pelada na quadra do prédio, em que o som das patadas na bola e dos bate-bocas ecoa melancolicamente pelas paredes do espaço despovoado.

Mesmo em pequeno número a voz rouca das massas mulambas se fez ouvir com extraordinária clareza. E não foi só na hora em que pegou no pé no mala do Rafinha. Para quem assistia pela TV, ouvir aqueles cânticos entranhados em nossa memória coletiva em um volume moderado soou como música sacra. Enfrentando com galhardia a atual impossibilidade de estarem reunidos fisicamente com as velhas amizades forjadas à beira dos gramados, não foram poucos os rubro-negros que à distância se emocionaram ao ouvir os peculiares timbres daqueles porra, caralho, vai tomar no cu gritados em uníssono.

A arquibancada flamenga, mesmo esvaziada, mesmo dando mole com máscara, álcool gel e distanciamento, mesmo cingida pela intransponível muralha sócio econômica, ainda é a expressão mais refinada do que o futebol tem de melhor, que é unir as gentes e promover a difusão do conhecimento. Mas não dá pra ignorar que lá no gramado o Flamengo estava jogando a sério. E, pra variar, ganhando mais uma da gauchada e emputecendo de verdade os gremistas.

Os gaúchos vieram muito a fim de arrumar desamizade, pertubaram o jogo todo. E deram a sorte de pegar um juiz fraco, sem moral, que em cinco minutos de bola rolando já tinha deixado o jogo virar reunião de condomínio. Todas as suas decisões eram motivo pra conversa, debate e protesto. Lateral, bola ao chão, faltinha, os gremistas choravam por tudo, tudo doía. O Flamengo, juvenilmente, entrou na pilha dos caras e quase arruma problema pras próximas partidas.

O segundo tempo não tinha nem 15 minutos quando Renight começou a mexer no time, poupando os mais débeis e contendo os mais exaltadinhos. O juiz já tava todo enrolado, os jogadores passavam a mão na sua bunda FIFA acintosamente. E, claro, enquanto isso o Flamengo vinha sendo roubado sem o menor pudor.

Até que Everton Ribeiro meteu mais um cruze daqueles perfeitos e Pedro, cheio de estilo, mando uma bike certinha. Só que um rebelde gremista meteu a mão na bola e a desviou do seu destino certo. Foi preciso que os caras do VAR, que não são de confiança, chamassem a atenção do infausto apitador para a penalidade que ocorria diante dos seus olhos, nada acontece, feijoada.

Pedro cobrou e guardou, com o 1×0 consignado no placar o pré-aposentado Scolari apostou tudo na força do ódio, do recalque e do ressentimento colocando em campo Diego Souza e Everton, dois muquirana com o coração cheio de mágoa. Não adiantou nada, logo depois Pedro meteu outro gol e acabou com as quartas de final da Copa do Brasil. Chega dessas mixarias. Temos a América e o mundo pra reconquistar, não nos façam perder tempo com fregueses locais já fidelizados.

O Flamengo segue em frente, exibindo números absurdos, tais como os abusivos 50 gols marcados em tão somente 16 jogos. Desempenho que explicam os assombrosos números de Renato Gaúcho na cátedra flamenga: 89,6 % de aproveitamento, com 14 vitórias, 1 empate e 1 derrota. Fenomenal, se melhorar estraga. Sapato, Renight, sapato! Ainda não é a hora de se amostrar, mais quatro jogos e gente acaba com essa palhaçada de Copa do Brasil.